terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Acesso à cidade pode estimular participação política dos jovens

Num contexto marcado por profundas desigualdades sociais, encontrar modos de despertar na juventude atitudes participativas, capazes de promover a autonomia, tornando os jovens protagonistas de suas narrativas de vida, representa um desafio estrutural de difícil equação.

“Para o jovem que vive em áreas de alta vulnerabilidade social, o acesso à cidade ainda é uma das mais severas formas de desigualdade”, afirma Ana Cláudia Arruda Leite, gestora dos Jovens Urbanos, programa da Fundação Itaú Social e do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), que visa ampliar o repertório de jovens entre 16 e 21 anos, residentes na periferia de grandes metrópoles, por meio de oficinas.
Fortalecer a formação crítica do jovem é uma prioridade, afirma a docente da UFF, Lívia de Tomasi.


Convidada do debate “Juventude e Direitos: a Dimensão Política no Trabalho Educativo”, realizado no último dia 23/11, no Memorial da América Latina, pelo Programa Aprendiz Comgás (PAC), Ana Cláudia ressaltou que as transformações começam pela apropriação da cidade.

“Uma proposta pedagógica mais participante requer currículos menos pré-definidos e mais cartográficos, pensados a partir da disposição para a prática, pela qual se faz, produz, experimenta e explora tendo em vista a política, as histórias de vida, o mundo do trabalho e a cidade”, propõe.

Em São Paulo, um exemplo disso é a Agência Popular Solano Trindade, cujo objetivo é movimentar a economia local, instrumentalizando grupos culturais da periferia e fortalecendo a troca de serviços a partir da moeda Solano – criada e utilizada pelos agentes integrados à Agência.

Esta foi a solução encontrada para viabilizar projetos e promover a circulação de bens culturais e de serviços no Capão Redondo, bairro da zona sul da capital paulistana, marcado por profundas desigualdades sociais. Thiago Vinícius de Paula da Silva, articulador comunitário da Agência, relembra que foi a partir de atividades realizadas na comunidade, com diferentes faixas etárias, que se notou o potencial transformador dos contatos.

“Eram ocasiões, na casa das pessoas, em que se alfabetizavam adultos enquanto se aprendia outro saber de volta. Com a Agência, essa circulação se tornou a própria moeda local de troca na comunidade.”

Para ele, esta é uma ação que, além de tornar possível eventos culturais pela cidade – apropriando-se dela na prática – com grupos e agentes locais, também revela uma crítica às políticas culturais vigentes.  “É um trabalho que modifica vidas. O fundo popular de cultura, criado na comunidade, é uma crítica aos atuais modos de fomento, que não nos representam”, afirma.


Gerações

Já a professora de sociologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Lívia de Tomasi, aposta na organização de jovens e adultos para gerar uma ação política forte e resistente. “Hoje é sempre mais difícil se organizar para reivindicar direitos. Fortalecer a formação crítica do jovem é uma prioridade, e não apenas ensinar a fazer projetos para concorrer a editais”, ressalta.

Segundo a socióloga, ampliar o raio de ação para além dos jovens, considerando que a reivindicação por ocupação dos espaços públicos e uso da cidade é comum a outros grupos que nela convivem, pode ser estratégica. “A focalização em grupos etários específicos impediu o encontro entre gerações”, argumenta. Por isso, sua proposta passa por um diálogo intergeracional.

Lívia defende ainda a necessidade de resgatar a ótica dos direitos. “E garantir o direito – no caso, o direito que a classe trabalhadora levou anos para conquistar, que inclui aposentadoria, poder ficar doente, etc. – é dever do Estado.” Do lado oposto, acrescenta ela, estaria o excesso de responsabilidade individual nas relações de trabalho. “Teríamos uma classe de empreendedores tão mobilizada quanto foi a de trabalhadores no passado?”


PAC

Parceria entre o Aprendiz e a Comgás, o programa, em vigor desde 2000, contribui para a formação de jovens estudantes do ensino médio e técnico, de escolas públicas e privadas interessados em coordenar e executar projetos sociais. Além disso, atua junto a professores e educadores da rede pública disseminando a tecnologia social Aprendiz Comgás para influenciar políticas públicas para a juventude. Durante os seus doze anos de história, o PAC já atendeu 3.319 jovens e a aplicação de 740 projetos comunitários.

O evento no Memorial da América Latina marcou também o lançamento da 3ª Edição das publicações voltadas à Tecnologia Social para Juventude do PAC. “A ideia é ampliar o olhar e pensar a sociologia de uma maneira mais integrada com o cotidiano do jovem, com o contexto das escolas, sair da teoria colocando o aprendizado na prática”, destaca Ivy Moreira, gestora do projeto.


Fonte:http://portal.aprendiz.uol.com.br/2012/12/03/acesso-a-cidade-pode-estimular-participacao-politica-dos-jovens/